Lisboa à Queima-Roupa — "Porque é que deixamos ir as pessoas que mais amamos?" [🦅Arda #4🦅]

 


"Trabalho arduamente e deixo o resto nas mãos do destino"

Naquela madrugada no aeroporto, eu sabia que ela ia mesmo embora. Não só por uns dias. Não só para Brasília. Ia-se embora de mim, e do que éramos. E o mais estranho? Eu deixei. Abracei-a, disse até amanhã, a brincar, e sorri... como se não me estivesse a desfazer por dentro.

No caminho de regresso, com os tuneis a passar pelas janelas do metro, a chorar como se algo de mal tivesse acontecido, não pude deixar de me perguntar: porque é que deixamos ir as pessoas que mais amamos?


Não estou a falar de relações tóxicas ou de finais anunciados. Estou a falar daqueles amores bonitos. Aqueles em que, mesmo com tudo certo, algo fica torto. Um silêncio cresce. Um gesto falha. Um timing escapa. E, de repente, sem gritos nem drama, uma pessoa que foi casa passa a ser um cheiro que ficou.

Talvez deixemos ir porque nos ensinaram que amar é também saber sair do caminho. Que o verdadeiro amor é generoso. Que não prende, não exige, não força. Mas quem é que inventou essa versão passiva do amor? Quem é que decidiu que deixar partir é mais nobre do que pedir que fiquem?

Ou talvez o façamos porque há um momento - e quem já passou por ele sabe - em que percebemos que continuar seria um pedido de socorro disfarçado. E então fazemos aquilo que ninguém nos ensinou: calamos o coração, e deixamos que a cancela se feche.


Mas o mais duro? É que o amor não morre nesse momento. Ele fica. Fica no corpo. Nos lugares. Nas pequenas rotinas que agora fazemos sozinhos. Ele não desaparece - só muda de sítio. Fica como um eco bonito e amargo do que poderia ter sido, se o mundo fosse um pouco mais gentil e se a minha felicidade pudesse durar.

E a verdade, por mais difícil que seja de aceitar, é que às vezes o amor não chega. Mesmo quando existe. Mesmo quando é mútuo. Mesmo quando é puro. Porque o amor não é algo singular, e precisa de espaço e de tempo - e há dias em que o amor de outras pessoas também tem de ser valorizado.


Por isso deixamos ir. Não por não amar. Mas porque entendemos que, de forma crua e silenciosa, há amores que, para se manterem bonitos, têm de ultrapassar fases difíceis.

E talvez sobrevivam. Ou talvez fiquem para sempre onde os deixámos: naquele abraço no aeroporto.

A doer - mas felizes.

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