Lisboa à Queima-Roupa — “O que fazer quando não somos suficientes?” [🦅Arda #1🦅]


"Trabalho harduamente e deixo o resto nas mãos do destino"


Há dias em que percebemos que não chegamos lá. Ponto final. Não somos bonitos o suficiente, nem interessantes, nem provocativos, nem sexy. Simplesmente não chegamos para tudo que qualquer outra pessoa queira - ou para o que o mundo exige.

Dizem que ninguém deveria sentir-se assim - insuficiente. Mas a verdade é que, mais cedo ou mais tarde, quase toda a gente descobre o sabor agridoce de não bastar. Não ser o bastante para alguém ficar, para alguém escolher, para alguém ficar calado quando podia magoar.


No início, a culpa bate-nos como uma ressaca: "Devia ter dito menos. Devia ter dito mais. Devia ter sido mais interessante, mais misterioso, menos transparente, ter tido mais atitude." Somos uns génios da autocrítica quando se trata de nos reduzirmos.

A resposta óbvia a isto seria, claro, tentar mais. Passar noites a limar arestas da nossa personalidade, aprender a gostar de comida indiana, fingir que adoramos caminhadas às seis da manhã... ignorar aquela pontada no nosso peito que avisa: "não és tu que está a mais, é a parte de ti que te quer apagar".

Mas ninguém quer ouvir isso. E muito mais divertido acreditar que, se ajustarmos o tom de voz, se formos menos ciumentos, mais ocupados, mais magnéticos - então, quem não nos quis vai voltar num cavalinho branco.

Spoiler: não volta. E se voltar, vem buscar aquilo de que se esqueceu de levar.


Há quem chame isto de "romantismo". Eu chamo hábito. O hábito de pôr o coração em saldo e esperar que alguém faça fila para comprar. O problema? Normalmente passa toda a gente, folheia, experimenta, e ninguém leva. Somos calças que sairam de moda em 2022 e que estão com 70% de desconto.

O que fazer, então? Talvez nada. Talvez aprender que não ser suficiente para alguém não faz de nós insuficientes. Faz de nós pessoas com mais tempo livre para gastar noutra coisa que não seja convencer quem não quer ser convencido.


A verdade é que, quando não somos suficientes para alguém, quase sempre estamos a transbordar para nós próprios. E, numa cidade tão grande como a de Lisboa, há sempre quem repare. Quem fique. Quem nos escolha sem pedir que nos encolhamos.

Não há manual para isto. Não há meditação que cure a ferida no ego. Há é cafés demorados com quem nos faz rir, amigos que dizem "larga isso", mensagens não respondidas e silêncios que, de repente, sabem a férias.


No fim, quem não nos achou suficientes, fica com um lugar vago na mesa. E nós seguimos, de copo cheio, ligeiramente magoados - mas intactos na parte que interessa: a que não nos podemos dobrar para caber no bolso de ninguém.

Comentários

  1. Arda você escreve TÃO TÃO BEM MEU DEUS?????? Ansiosa por mais posts!!

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  2. Deliciosa a leitura. Bate com uma reflexão que estava tendo hoje mesmo. Obrigado por compartilhar seus pensamentos e conclusões.

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